quinta-feira, 19 de junho de 2014

Crônica de um amor ilusório



A noite será clara. A lua, cheia. Ele e ela passearão descalços pela praia. Ele terá em suas mãos duas rosas brancas. Olhará para o mar - este estará belo. Olhará para ela - esta, estará muda. Para o mar, não oferecerá rosas, oferendas a Iemanjá, com um pedido: Oh, rainha do mar, olhar por mim e por ela. Para ela, oferecerá ilusão, atenção e carinho.

Ela, fantasiada de uma personagem louca, estará a sonhar que ele pode ser seu Bukowski. Ele, apaixonado pela paixão e mais nada, sonhará que ela poderá vir a ser sua Isolda. E esquecendo-se das diabruras cometidas pela amargura e do peso que por vezes pode sentir ao carregar tantos sonhos e tantas esperanças, eles falarão de coisas que estar-se-ão dispostos a acreditarem reais e profundamente sentidas.

Conversando, deixarão para trás o mar murmurento e caminharão até um bar - o qual poder-se-ia acreditar saído das páginas do "Crônicas de um amor Louco" - que estará repleto de boêmios, artistas, miches, prostitutas, enfim, apinhado de personagens bossa Anjos da Noite.

A única mesa ainda solitária será encontrada lá, bem no fundo do bar. Eles sentarão, pedirão um whisky, enquanto ao lado, nas mesas ao redor, personagens boêmios e embebedados estarão trocando beijos, risos e abraços escandalosos.

Ela girando com a mão esquerda o copo de whisky, lhe dirá, sorrindo: - Gosto de ti, baby. Gosto porque sei que dentro dessa sua imensa solidão interior - somente amenizada pela sua paixão pela paixão - você consegue arrastar-se daqui; ferir-se dali; roçar a felicidade num extremo; mergulhar no outro; mas, teimosamente, manter acesa dentro do mais recôndito de ti, a chama da paixão pela sua própria paixão.

Ele ouvira. O que tem a dizer? Nada, somente ouvira. E então, lembrará de alguma coisa linda, lida, que dizia mais ou menos assim: "Palavras, palavras. Não será tudo palavras? Palavras que a paixão destila, essa paixão fingida e falsa que nada revela, nada sente, apenas expressa, dá-se gratuitamente e espera um exercício, para chegar a algum lugar."

E - verdadeiramente - ele dirá: - Ela, a paixão, não será assim mesmo? Uma dissimulação? Uma expressão? Um mero jogo de embustes? E os apaixonados, não serão vendedores de ilusão?

Ela passará delicadamente a mão no rosto dele, e sussurrará repetidas vezes: - Bobo, ah seu bobo! Ai complementará, maliciosamente - ainda iludidamente louca, que encontros bukowskianos jamais podem terminar numa mesa de bar. Então muita coisa estará por acontecer dentro dessa invertida trilogia.

Mas o dia raiará. E, em o dia amanhecendo, com certeza cada um irá para o seu canto. Ela, ainda sonhando em encontrar o seu Bukowski - encontrara, encontrará? Ele também ainda a sonhar com a vinda de sua Isolda - virá? Não sei baby.

Ela talvez venha a dizer: - A gente volta a se encontrar. Certamente - ele responderá monossilábico antes de se despedirem com um leve beijo na boca.

Eles, iludidos ou não, terão sido felizes, Momentaneamente? Inutilmente? Não importa, desde que se repita. Afinal de contar, o raiar de um novo dia sempre foi, continua sendo e será um novo dia, não é baby?

(Crônica escrita em 2009 para alguém que nunca foi um amor)

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